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Mencionar “chamada da rede fixa nacional” ou “rede móvel nacional”?

Do regime de disponibilização e divulgação de linhas telefónicas para contacto do consumidor.

 

O Decreto-lei n.º 59/2021, de 14 de julho veio estabelecer o regime aplicável à disponibilização e divulgação de linhas telefónicas para contacto do consumidor, incluindo determinar os termos da informação referente aos contactos disponibilizadas pelas empresas ao consumidor.

Numa primeira leitura, todas as empresas são obrigadas a apresentar o preço real das chamadas e - se tal não for possível - mencionar, logo após o número de telefone que se trata de um número para “chamada da rede fixa nacional” ou “rede móvel nacional”, sendo aplicável aos sites, faturas, papel de carta, e-mails ou qualquer suporte que mencione o contacto da empresa.

Este Decreto-lei determina também a aplicação de coimas entre 650 euros para pessoas singulares ou 1.700 euros para microempresas até 24 mil euros para grandes empresas, 90 mil euros se for uma contraordenação grave ou muito grave, respectivamente.


Contexto

A Lei n.º 24/96, de 31 de julho, na sua redação atual, estabelece, no n.º 1 do artigo 9.º-D que "a disponibilização de linha telefónica para contacto no âmbito de uma relação jurídica de consumo não implica o pagamento pelo consumidor de quaisquer custos adicionais pela utilização desse meio, além da tarifa base, sem prejuízo do direito de os operadores de telecomunicações faturarem aquelas chamadas".

A redação deste artigo corresponde à transposição para o ordenamento jurídico interno do artigo 21.º da Diretiva 2011/83/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativa aos direitos dos consumidores, que estabelece o dever de os Estados-Membros garantirem que, no caso de o profissional utilizar uma linha telefónica para ser contactado em relação ao contrato celebrado, o consumidor, ao contactar o profissional, não fique vinculado a pagar mais do que a tarifa de base.

A aplicação do disposto no referido n.º 1 do artigo 9.º-D tem sido dificultada pela ausência de um entendimento comum sobre o conceito de "tarifa base", mencionado na sua redação. Acresce que enquanto a diretiva, na sua versão portuguesa, fala em "tarifa de base", o legislador nacional optou por usar a expressão "tarifa base", o que aumentou as dúvidas interpretativas. Na verdade, enquanto a expressão "tarifa base" remete para uma ideia de tarifa ideal recomendada para todos os consumidores, a expressão "tarifa de base" transmite a ideia de tarifa normal de cada consumidor em concreto.

A propósito deste conceito, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), no Acórdão n.º C-568/15, de 2 de março de 2017, e no âmbito de uma questão prejudicial sobre a aplicação do artigo 21.º daquela diretiva, considerou que o conceito de tarifa de base corresponde ao custo normal de uma comunicação habitual que o consumidor esperaria suportar, ou seja, refere-se à tarifa habitual da comunicação telefónica, sem despesas suplementares para o consumidor. O mesmo Tribunal concretiza esta ideia, concluindo que o custo ou preço de uma chamada relativa a um contrato de consumo celebrado, efetuada para uma linha telefónica de apoio ao cliente, explorada por um profissional, não pode exceder o custo de uma chamada para uma linha telefónica geográfica fixa comum ou para uma linha telefónica móvel.

Aquilo que o TJUE pretendeu foi, portanto, esclarecer que quando o consumidor contacta telefonicamente o fornecedor de bens ou o prestador de serviços não pode pagar mais do que aquilo que pagaria por uma chamada normal para um número geográfico ou móvel.

Isto significa, por exemplo, que caso o consumidor disponha de um tarifário que inclua «pacote de minutos» para qualquer número geográfico ou móvel a chamada efetuada deve ser descontada no valor de minutos disponível no seu tarifário, não podendo ser cobrado um valor adicional - só naquela hipótese se pode dizer que o consumidor está a efetuar uma chamada dentro do custo normal que esperaria suportar.

Assim, este decreto-lei procurou, deste modo, esclarecer e concretizar as regras a que se encontra sujeita a disponibilização de linhas telefónicas para contacto do consumidor, condensando, num único diploma, as diversas normas que o problema convoca.

Esta opção sistemática implica a revogação do artigo 9.º-D da Lei n.º 24/96, de 31 de julho, na sua redação atual, acompanhada da sua reprodução e clarificação no âmbito do decreto-lei.

Aproveitou, o legislador, a oportunidade de regular, a título definitivo, a questão das linhas telefónicas disponibilizadas por entidades que prestam serviços públicos essenciais, atualmente regulada na Lei n.º 7/2020, de 10 de abril, na sua redação atual, a qual estabeleceu regimes excecionais e temporários de resposta à epidemia SARS-CoV-2. Não sendo a questão exclusiva do presente contexto pandémico pelo que se considera adequado regular o tema a título permanente, de preferência, no mesmo lugar sistemático onde são reguladas as demais questões relativas a linhas telefónicas.

 

Do Dever de Informação

O Decreto-lei n.º 59/2021, no seu Artigo 3.º veio impor um "Dever de informação" a qualquer entidade que disponibilize linhas telefónicas para contacto do consumidor.

Tal dever consiste em divulgar, de forma clara e visível, nas suas comunicações comerciais, na página principal do seu sítio na Internet, nas faturas, nas comunicações escritas com o consumidor e nos contratos com este celebrados, quando os mesmos assumam a forma escrita, o número ou números telefónicos disponibilizados, aos quais deve ser associada, de forma igualmente clara e visível, informação atualizada relativa ao preço das chamadas.

A informação relativa aos números e ao preço das chamadas deve ser disponibilizada começando pelas linhas gratuitas e pelas linhas geográficas ou móveis, apresentando de seguida, se for o caso, em ordem crescente de preço, o número e o preço das chamadas para as demais linhas.

Quando não é possível apresentar um preço único para a chamada (por ser variável em função da rede de origem e da rede de destino) deve, em alternativa, ser prestada a seguinte informação, consoante o caso: "Chamada para a rede fixa nacional" e "Chamada para rede móvel nacional".

Assim, assistiu-se a vários empresários a correr a acrescentar "Chamada para a rede fixa nacional" e "Chamada para rede móvel nacional" nas suas comunicações comerciais, na sua página na Internet, nas faturas e nos contratos.


Contraordenações

A violação do Dever de Informação constitui contraordenação económica grave, punível nos termos do Regime Jurídico das Contraordenações Económicas (RJCE).

Também, constitui contraordenação económica muito grave, punível nos termos do RJCE: o custo das chamadas for superior ao valor datarifa de base; não se disponibilizar uma linha telefónica gratuita ou, em alternativa, uma linha telefónica a que corresponda uma gama de numeração geográfica ou móvel; ou forem cobrados simultaneamente, o preço da chamada e um preço adicional pelo serviço prestado.

A negligência e a tentativa são puníveis nos termos do RJCE.

A fiscalização do cumprimento do disposto na presente lei, bem como a instrução dos respetivos processos de contraordenação e a aplicação de sanções, competem à autoridade administrativa reguladora do setor no qual ocorra a infração ou, na falta de entidade sectorialmente competente, à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE).

 

A quem se aplica?

Nos termos do n.º 1 do artigo 2.º do diploma, este aplica-se às linhas telefónicas para contacto do consumidor disponibilizadas por fornecedores de bens ou prestadores de serviços e por entidades prestadoras de serviços públicos essenciais.


O fornecedor de bens ou prestador de serviços

Nos termos do n.º 1, do artigo 4.º, o custo, para o consumidor, das chamadas efetuadas para as linhas telefónicas disponibilizadas pelo fornecedor de bens ou pelo prestador de serviços, para contacto daquele, no âmbito de uma relação jurídica de consumo, não pode ser superior ao valor da sua tarifa de base.


Todas as Empresas?

O legislador ao escrever "linha telefónica para contacto no âmbito de uma relação jurídica de consumo" pode abranger, na sua literalidade, os casos em que a própria chamada telefónica se traduz na relação jurídica de consumo, como sucede nos casos em que o serviço prestado ao consumidor é a própria chamada.

Porém, não é seguramente, intenção da lei a de abranger este tipo de chamadas quando impõe que o pagamento da chamada não pode ir além da tarifa de base, pelo que se entende ajustado que as relações abrangidas pela norma fiquem devidamente delimitadas.

O legislador quis abranger apenas chamadas efetuadas para as linhas telefónicas disponibilizadas pelo fornecedor de bens ou pelo prestador de serviços, para contacto daquele, no âmbito de uma relação jurídica de consumo.

Assim, tais fornecedores de bens ou os prestadores de serviços estão obrigado a disponibilizar ao consumidor uma linha telefónica gratuita ou, em alternativa, uma linha telefónica a que corresponda uma gama de numeração geográfica ou móvel.

Não se consideram contactos telefónicos no âmbito da relação de consumo as chamadas telefónicas que constituem uma prestação de serviço autónoma, que não esteja relacionada com o fornecimento de qualquer bem ou a prestação de qualquer serviço prévios ao consumidor, por exemplo as chamadas de telemedicina e de televoto e as destinadas a campanhas de angariação de fundos.

 

E o Dever de Informação?

O artigo 3.º expressamente aplica-se a qualquer entidade; porém, limitado a quem, nos termos do próprio diploma, disponibilize linhas telefónicas para contacto do consumidor, no âmbito da relação de consumo, i.e. relacionada com o fornecimento de um bem ou a prestação de um serviço prévio.


E quanto aos profissionais independentes?

Os profissionais independentes (e.g. advogados, solicitadores ou médicos) não praticam atos de comércio, enquanto titulares de profissões autónomas, assim, não se lhes aplica a obrigação entendo que não se aplica, porquanto, estes profissionais não tem uma profissão mercantil, logo não são comerciantes, nem fornecem qualquer bem ou serviço prévios ao consumidor.

 

Conclusão

Salvo melhor opinião, como resulta do supra enunciado esta legislação aplica-se a empresas que prestem serviços por telefone (incluindo esclarecimentos posteriores a uma venda ou a uma prestação de um serviço) e no âmbito de relações de consumo (comerciais) prévias.

Porém, qualquer entidade (empresa, associação, profissional independente) que disponha de uma linha de valor acrescentado ou que disponibilize uma linha telefónica gratuita ou uma linha telefónica a que corresponda uma gama de numeração geográfica ou móvel, deverá colocar o valor da chamada (o valor base).

Assim, a obrigação de colocar logo após o número de telefone que se trata de um número para “chamada da rede fixa nacional” ou “rede móvel nacional, é restrita aplica-se a entidades que prestem serviços por telefone ou no âmbito de relações de consumo prévias. Senão, também todo o fornecedor de bens ou o prestador de serviços estaria obrigado a disponibilizar ao consumidor uma linha telefónica gratuita ou, em alternativa, uma linha telefónica a que corresponda uma gama de numeração geográfica ou móvel.

 

Disclaimer

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